NO TERMINAL GENTILEZA, UM TREINAMENTO DE CRISE E A LEMBRANÇA DO HOMEM QUE PREGAVA O AMOR
Forças de segurança simulam ação com reféns no local que carrega o nome de um dos maiores símbolos de paz e empatia do Rio de Janeiro
Na noite desta quinta-feira (05/06), o Terminal Gentileza, ponto estratégico de conexão urbana no coração do Rio de Janeiro, foi palco de uma simulação de alta complexidade. Policiais militares e civis, em parceria com o VLT Carioca, participaram de um exercício coordenado de resposta a situações de crise com reféns. A atividade, meticulosamente planejada, visou testar a integração entre as forças de segurança e o tempo de resposta em um ambiente real, marcado por intenso fluxo de passageiros.
A ação começou com uma tentativa simulada de assalto a uma loja no mezanino do terminal. O criminoso mantinha um funcionário como refém. O cerco foi estabelecido pelo BOPE, e a rendição do suspeito contou com a intervenção do Batalhão de Ações com Cães (BAC). Em seguida, agentes da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) entraram em ação para neutralizar uma ameaça explosiva. Tudo ocorreu sem impacto nos serviços, com a operação funcionando em paralelo à rotina dos usuários.
Helicópteros, cães farejadores, atiradores de precisão e socorristas participaram da mobilização, que contou ainda com o apoio do Corpo de Bombeiros e da Guarda Municipal. A movimentação intensa contrastou com o cotidiano habitual do terminal, mas foi essencial para o mapeamento estratégico da área e aprimoramento da atuação em situações reais.
— O Rio de Janeiro está sempre na rota de grandes eventos e possíveis ameaças. É essencial que as forças de segurança estejam integradas e preparadas. Este exercício é parte de um esforço contínuo para garantir a resposta mais eficiente possível — explicou o delegado Jader Amaral, da Subsecretaria de Operações Integradas da Secretaria de Segurança Pública.
Para Sílvia Bressan, diretora do VLT Carioca, a simulação é um passo importante para consolidar a segurança do espaço.
— Diariamente, milhares de pessoas passam pelo Terminal Gentileza. Nosso dever é estarmos prontos para qualquer eventualidade. Essa integração com as forças policiais é fundamental — destacou.
Mas há algo além do treinamento em si. O nome do local onde tudo aconteceu remete à figura quase mítica de José Datrino, o Profeta Gentileza — homem que, após uma tragédia no Brasil nos anos 60, abandonou tudo para dedicar a vida à propagação de uma mensagem simples, mas poderosa: “Gentileza gera gentileza”.
Datrino percorria as ruas do Rio vestindo túnicas e escrevendo suas mensagens em muros, viadutos e corações. Transformou a dor coletiva do incêndio do Gran Circus Norte-Americano — onde mais de 500 pessoas, a maioria crianças, perderam a vida — em uma missão pessoal de cura social. Pregava o amor, a solidariedade, a escuta e a empatia, contrapondo-se ao ódio e à pressa das cidades grandes.
Hoje, o Terminal Gentileza carrega seu nome, sua filosofia, sua memória. E é justamente ali que um treinamento com armas, helicópteros e ações táticas foi realizado. O contraste é inevitável — e necessário.
É nesse ponto que a reflexão se impõe: em um espaço nomeado em homenagem à paz e ao respeito, é possível pensar segurança como uma prática que não anula, mas incorpora a gentileza. A cidade moderna precisa de operações bem coordenadas, mas também de memória, humanidade e propósito.
E talvez seja isso que José Datrino gostaria de ver: que, mesmo nos treinamentos de crise, não se perca de vista a essência da sua mensagem — a de que, no fim, só o amor constrói.
Por Gazeta Rio/Ricardo Bernardes