GUATEMALA ELEGE PRESIDENTE EM MEIO A MANOBRAS JUDICIAIS PARA AFASTAR O FAVORITO ARÉVALO
9,4 milhões de guatemaltecos estão convocados para votar neste domingo entre os dois candidatos mais votados no primeiro turno de 25 de junho: Sandra Torres e Bernardo Arévalo
A Guatemala escolhe no domingo (20) o seu presidente num segundo turno no qual o candidato do partido de centro-esquerda Movimento Semente, Bernardo Arévalo, chega como favorito, porém enfrentando tentativas de excluí-lo do processo com “manobras” e “obstáculos legais”, enquanto sua adversária, a ex-primeira-dama Sandra Torres, “está se antagonizando” ao se aliar com militares, alertaram analistas à Télam.
Cerca de 9,4 milhões de guatemaltecos estão convocados para votar neste domingo entre os dois candidatos mais votados no primeiro turno de 25 de junho: Torres, da Unidade Nacional da Esperança (UNE) e ex-esposa do ex-presidente Álvaro Colom (2008-2012), obteve 15,86% dos votos, enquanto Arévalo, filho do ex-presidente reformista Juan José Arévalo (1945-1951), conquistou 11,77%.
A campanha para o segundo turno foi marcada por duas ações judiciais. Por um lado, um grupo de partidos que perdeu em junho pediu uma revisão dos resultados e, por outro lado, um promotor especial de combate à corrupção acusou o Movimento Semente de irregularidades nas filiações.
No caso da primeira causa, os resultados foram confirmados e o Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) e a Corte Constitucional (CC) permitiram que o Semilla participasse do segundo turno.
Quanto à segunda, a Suprema Corte de Justiça decidiu ontem contra o pedido da promotoria, mas isso não impediu que o espaço de Arévalo acredite que os esforços para retirá-lo da corrida presidencial possam continuar.
“Não temos dúvidas de que eles continuarão tentando (excluir Arévalo). O sistema de corrupção continuará resistindo, pois têm muitos privilégios a perder. Eles não nos veem como alguém em quem confiar para a corrupção. Tentarão nos pressionar, colocar obstáculos legais e buscar artimanhas”, disse à Télam a deputada eleita Andrea Villagrán, do Movimento Semente.
Apesar do receio de possíveis avanços judiciais contra o partido, a deputada eleita, que assumirá em 14 de janeiro, demonstrou confiança numa vitória de Arévalo.
“Será uma vitória contundente e uma mensagem muito forte da população para o sistema corrupto que não entende que são minoria e que o povo quer tirá-los do Estado”, afirmou.
Na quinta-feira, o promotor especial Rafael Curruchiche – sancionado pelos Estados Unidos – deu sinais de que continuará com os processos contra o Semilla: “Estimo que após 20 de agosto terão que registrar a suspensão do partido político no sistema”, declarou.
Por sua vez, o analista Álvaro Montenegro, que fez parte da organização Justicia Ya, que foi uma referência nos protestos de 2015 contra a corrupção, mencionou a esta agência o clima de preocupação com uma “possível anulação do Semilla” e porque “existem instituições que continuarão sendo controladas pela corrupção, como o Congresso e a Justiça”.
“O Poder Judiciário estava tentando, com diferentes manobras, evitar a candidatura do Semilla. Antes da eleição é difícil, mas depois eles vão continuar tentando a sua anulação”, assegurou.
Montenegro também falou sobre as expectativas da população.
“Há muita esperança e mobilização cidadã, as pessoas estão fazendo propaganda e cartazes apoiando Arévalo com seus próprios recursos. Na quarta-feira, foi o encerramento da campanha do Semilla no Parque Central, um lugar histórico onde muitos protestos populares foram realizados”, comentou.
Arévalo, um sociólogo de 64 anos, é o favorito para o segundo turno de domingo, de acordo com as pesquisas da ProDatos e Cid Gallup, que lhe dão entre 64,9% e 61% de intenção de voto, respectivamente, enquanto a Torres é atribuída uma porcentagem entre 35,1% e 28%.
Torres, com 67 anos e favorita apenas na medição da empresa Innovem, que lhe dá 47,67%, em comparação com 44,87% de Arévalo, tem se inclinado cada vez mais para a direita nesta campanha, na qual tenta chegar à presidência pela terceira vez.
Na terça-feira, ela assinou um acordo com a Associação de Veteranos Militares da Guatemala (Avemilgua) com a promessa de benefícios se for eleita.
Segundo Montenegro, o grupo é composto por militares que participaram durante o conflito armado interno entre os anos 60 até os acordos de paz de 1996 e “defenderam anistias para crimes de guerra, promoveram a impunidade para os condenados por violações dos direitos humanos e muitos têm ligações com o crime organizado”.
“Torres se associou a esta associação como uma mensagem muito forte”, disse o bacharel em ciências jurídicas e sociais, enquanto Villagrán classificou a aliança como um “ato de desespero”.
De acordo com o analista, Torres “está antagonizando e movendo o discurso da ideologia de gênero, antiaborto e a favor das igrejas evangélicas”, que estão sendo mobilizadas de forma “clientelar”, e comparou a campanha com a do ex-presidente da Colômbia Álvaro Uribe e do Brasil Jair Bolsonaro, porque “são estratégias desinformativas, apelando ao eleitor mais conservador e aliando-se aos grupos poderosos”.
Por sua vez, o antropólogo Carlos Hoffman, assessor da equipe de governo de Torres, resumiu para a Télam as propostas da candidata como um “plano de governo bem fundamentado” e as sintetizou em “seis pilares”, entre os quais se inclui o “despertar econômico”, que envolve uma “agenda econômica agressiva de reativação”, bem como a transparência e a luta contra a corrupção.
Seja qual for o resultado de amanhã, quem vencer nas urnas não terá um partido majoritário no Congresso (unicameral) e terá que formar alianças.
Nas eleições de junho, o Movimento Semente ficou em terceiro lugar em termos de assentos, conquistando 23 dos 160, enquanto o UNE ficou em segundo com 28.
A primeira minoria será o Vamos, o partido do atual presidente de direita, Alejandro Giammattei, que encerra seu mandato em janeiro e chega com uma taxa de desaprovação de 76%, de acordo com a empresa ProDatos.
“Estamos abertos a fazer alianças, mas não com base em favores ou clientelismo”, disse Villagrán e mencionou a proposta de criar um “Sistema Nacional Anticorrupção”.
Hoffman concordou que, se o UNE vencer, enfrentarão um “cenário complicado no legislativo”, mas argumentou que seu programa não tem “dependência excessiva do Congresso”.
“O que mais privilegiamos em nosso plano são decretos ministeriais e decisões executivas”, avaliou.
Diante da pergunta se é possível governar majoritariamente por meio de decretos, Hoffman esclareceu que “obviamente há uma participação legislativa”, onde o UNE “se comunica melhor com o resto dos atores políticos, ao contrário do Semilla, que optou por não dialogar com ninguém”.
E enfatizou que já fizeram parte de um governo sem maioria e, por isso, têm “uma vasta experiência com esse tipo de lobby e diálogos necessários para impulsionar uma agenda mínima para o país”.
Por Dacil Lanza, Télam