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DELTAN NEGOCIOU A DIVISÃO DO DINHEIRO COBRADO DA PETROBRAS COM AUTORIDADES DOS EUA, MOSTRAM MENSAGENS

Mensagens compõem arquivo da Operação Spoofing e mostram que Dallagnol sabia da ilegalidade; ele não se pronunciou sobre a revelação

O ex-procurador e ex-deputado federal Deltan Dallagnol negociou com autoridades dos Estados Unidos, em sigilo, um acordo para dividir o montante que seria cobrado da Petrobras em multas e penalidades por conta de corrupção, no âmbito da Operação Lava Jato. O acordo foi negociado em conversas entre procuradores brasileiros e suíços no aplicativo de mensagens Telegram, reveladas nesta quinta-feira 20 pelos jornalistas Jamil Chade, do UOL, e Leandro Demori, da newsletter A Grande Guerra. Dallagnol não se manifestou sobre o tema. 

O contexto

Procuradores do Brasil e da Suíça conversavam por meio de aplicativo de mensagem, de maneira extraoficial. As conversas se justificavam porque as autoridades de Berna, no país europeu, eram responsáveis pela busca, pelo confisco e pelo detalhamento das contas que serviam como destino das propinas investigadas na Lava Jato. 

No início deste mês, mensagens entre essas autoridades mostraram a pressão exercida por Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato, sobre procuradores da operação.

As mensagens compõem os arquivos apreendidos pela Polícia Federal (PF) no curso da operação Spoofing, que investigou o hackeamento de procuradores da Lava Jato e de Moro. A revelação das mensagens, feita em 2020 pelo portal The Intercept Brasil, ficou conhecida como Vaza Jato.

As mensagens reveladas hoje remetem a janeiro e fevereiro de 2016. Naquela oportunidade, procuradores do Brasil e da Suíça julgavam importante o envolvimento dos Estados Unidos nos acordos envolvendo a Petrobras.

Em nenhum momento, nas mensagens reveladas, os procuradores citam a Controladoria-Geral da União, que, por lei, é o órgão competente para casos dessa natureza.

‘Tudo é confidencial’: a busca pelo sigilo no contato com os Estados Unidos

De acordo com a publicação, Dallagnol contou aos procuradores suíços, em 29 de janeiro de 2016, o resultado dos contatos que tinha feito com autoridades norte-americanas. 

“Meus amigos suíços, acabamos de ter uma reunião introdutória de dois dias com a SEC (Comissão de Valores Mobiliários) dos EUA. Tudo é confidencial, mas eu disse expressamente a eles que estamos muito próximos da Suíça e eles nos autorizaram a compartilhar as discussões da reunião com vocês”, escreveu Dallagnol em um trecho revelado.

Em seguida, o então procurador detalha o que foi tratado na reunião:

“Proteção às testemunhas de cooperação: eles protegerão nossos cooperadores contra penalidades civis ou restituições; Penalidades relativas à Petrobras. O pano de fundo: O DOJ e a SEC aplicarão uma penalidade enorme à Petrobras, e a Petrobras cooperou totalmente com eles. Eles não precisariam de nossa cooperação, mas isso pode facilitar as coisas e, se cooperarmos, entendemos que não causaremos nenhum dano e poderemos trazer algum benefício para a sociedade brasileira, que foi a parte mais prejudicada (e não os investidores dos EUA). Como estávamos preocupados com uma penalidade enorme para a Petrobras, muito maior do que tudo o que recuperamos no Brasil, e preocupados com o fato de que isso poderia prejudicar a imagem de nossa investigação e a saúde financeira da Petrobras, pensamos em uma solução possível, mesmo que não seja simples”, escreve 

“Eles disseram que se a Petrobras pagar algo ao governo brasileiro em um acordo, eles creditariam isso para diminuir sua penalidade, e que o valor poderia ser algo como 50% do valor do dinheiro pago nos EUA.”

O “DOJ”, ao qual Dallagnol se refere na mensagem, é o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.

Em 2018, a Petrobras fechou um acordo nos Estados Unidos, fazendo com que a companhia pagasse uma multa de 853,2 milhões de dólares para não ser processada. Do total, 80% foi destinado ao Brasil. O pagamento desse valor foi peça-chave para o fundo privado que a Lava Jato tentou colocar de pé, mas que foi barrado por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

No mesmo dia das mensagens acima, segundo a publicação, um procurador brasileiro (“Douglas”, conforme identificação nas trocas de mensagens) enviou aos representantes da Suíça uma lista de contatos entre as autoridades dos EUA relacionadas com fraude, da Seção de Confisco de Bens e Lavagem de Dinheiro.

Contrários ao entendimento do STF

O trecho acima se ambienta nas trocas ilegais de informação entre procuradores da Lava Jato e autoridades norte-americanas, conforme reportagens publicadas pelo The Intercept Brasil e pela Agência Pública. Em 2015, segundo as publicações, ao menos 17 agentes norte-americanos – do DOJ e do FBI – estiveram em Curitiba (PR), sem que o Ministério da Justiça tivesse conhecimento disso.

De acordo com a publicação de hoje, os procuradores da Lava Jato sugeriram aos norte-americanos meios para permitir que os EUA ouvissem delatores da Petrobras no Brasil, o que contraria entendimento do STF sobre a questão.

Dallagnol sabia da ilegalidade

No trecho abaixo, de fevereiro de 2016, Dallagnol é alertado pelo procurador Vladimir Aras – ex-diretor da Secretaria de Cooperação Internacional (SCI) da Procuradoria-Geral da República (PGR) – sobre a ilegalidade da proposta.

Dallagnol: “Obrigado, Vlad, mas entendemos com a PF que neste caso não é conveniente passar algo pelo executivo”.

Aras: “A questão não é de conveniência. É de legalidade, Delta. O tratado tem força de lei federal ordinária e atribui ao MJ [Ministério da Justiça] a intermediação. Estamos negociando com o Senado um caminho específico para os casos do MPF. Por ora, precisamos observar as regras vigentes”. 

Outro lado

Deltan Dallagnol e a sua assessoria não se manifestaram sobre as mensagens reveladas nesta quinta-feira 20.

POR ANDRÉ LUCENA/Carta Capital

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