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DE SAÍDA DA SAPUCAÍ, NEGUINHO DA BEIJA-FLOR DESCARTA APOSENTADORIA

Aos 75 anos, Neguinho da Beija-Flor anunciou sua despedida como intérprete da escola de samba que leva em seu nome, mas não quer saber de aposentadoria.

O artista trata seu adeus como protagonista na Sapucaí como uma renovação do compromisso com a música brasileira – assumido ainda criança – e quer investir ainda mais na carreira de cantor de sambas.

“Eu tinha duas funções no mundo do samba: eu tenho 41 álbuns gravados fora do carnaval. Vou dar continuidade. Vou ver se tenho mais uns 10, 15 anos. O Moreira da Silva cantou até os 99. O Jamelão até os 95. Vou ver se consigo chegar lá”, afirmou Neguinho, em conversa com o g1.

Parcerias

O último canto na Sapucaí será com o enredo sobre Laíla, com quem trabalhou no Cordão da Bola Preta, antes mesmo da Beija-Flor.

Mas, ainda este ano, ele lançará um álbum com um novo parceiro: Xande de Pilares.

Os dois receberam o g1 no estúdio onde finalizam o álbum “Empretecendo – Neguinho da Beija-Flor e Xande de Pilares”, em Copacabana, na Zona Sul do Rio.

O repertório é de sucessos da carreira de Xande e que têm valor afetivo para os dois. As gravações foram marcadas por momentos de emoção.

“A gente improvisa na música, a gente chora juntos”, disse Xande, deixando escapar mais algumas lágrimas.

“Eu sou um cara muito conservador nesse sentido de cuidar dos nossos professores. O Neguinho é um deles. Acho que, de todos, é o primeiro. O primeiro samba-enredo que eu ouvi e tive a certeza de que eu estava curtindo foi ‘Sonhar com Rei dá Leão’. Eu tinha 6 anos de idade”, disse Xande, citando o samba campeão do carnaval de 1976, na estreia de Joãosinho Trinta na Beija-Flor com enredo sobre o jogo do bicho.

Missão cumprida

Neguinho afirma que encerra seu ciclo na Sapucaí com a sensação de dever cumprido.

“Eu creio que eu estou deixando um aprendizado para quem está chegando. Eu sonhava em ser amigo dos que já estavam: Aroldo Melodia, Ney Viana, a Elza Soares, que foi a primeira intérprete da Mocidade; Jamelão, Martinho da Vila. Creio que muitos com a idade que eu tinha, uns 20, 22 anos, queiram ser um Neguinho, um Belo, um Xande de Pilares. Nesses 50 anos a gente deixa isso aí para quem está chegando agora”, destaca.

Segundo ele, os 75 anos pesaram na decisão de definir um último carnaval como a voz da Beija-Flor.

“Eu cheguei à conclusão de que a idade chegou, a idade chega para todo mundo. O tempo não para, como diz o grande mestre Cazuza. Não parou para mim. É cansativa a função do intérprete do carnaval, muito mais que fazer 3 horas, 4 horas de show.”

O cantor destaca que a função é mais pesada do que muitos imaginam.

“Eu costumo comparar o intérprete de samba de enredo com um maratonista. Nem todos nascem com esse dom. Temos vários cantores extraordinários, maravilhosos que tentaram cantar um samba na avenida e não conseguiram. Isso é um privilégio de poucos. Não querendo valorizar o que a gente faz, mas você tem que ter este dom. Cantar uma hora e meia na marques de Sapucaí sem intervalo é difícil. Não é qualquer um.”

Origem

Luiz Antônio Feliciano nasceu filho de músico que sonhava que ele tocasse trompete, Benedicto Feliciano Marcondes, o Bené do Pistão, morto em 2007. Não aprendeu o instrumento, mas transformou a voz em sua principal ferramenta.

Inicialmente conhecido como Neguinho da Vala, como uma lembrança da origem humilde em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, foi definitivamente rebatizado ao começar a cantar na Beija-Flor.

“Eu fui Neguinho da Vala dos 6 aos 25. Quando eu passei a fazer parte da Beija-Flor, é que saiu o da Vala e virou da Beija-Flor. Sugestão do Anísio [Abraão David, bicheiro e presidente de honra da escola] ‘Vamos tirar o da Vala, que é muito feio, eu não gosto, e vamos colocar o da Beija-Flor. Tá bom?’ E eu mudei.”

O nome com o qual é conhecido de norte a sul do país é mais famoso do que o nome com o qual foi inicialmente registrado. Assim, o jeito foi levar o apelido para o cartório e ele se tornar oficialmente Luiz Antônio Feliciano Neguinho da Beija-Flor Marcondes.

“Até em casa, bem poucas pessoas me chamam pelo nome. Nem a minha esposa. Ela, no caso, nem de Luiz e nem de Neguinho, mas de marido. Só existiam duas pessoas que me chamavam de Luiz: minha falecida mãe e meu falecido pai. Porque o Neguinho existe desde 6 anos de idade.”

por Cristina Boeckel, Gustavo Wanderley – G1

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