TRUMP EXALTA ‘REAPROPRIAÇÃO’ DO CANAL DO PANAMÁ APÓS COMPRA DE TERMINAIS PELA BLACKROCK

Negócio de US$ 22,8 bilhões envolve venda de participação majoritária em operadora de portos e reacende debate sobre soberania do canal

– Uma transação de grande vulto acaba de agitar o mercado portuário internacional, com a venda da maior parte dos negócios de portos do conglomerado de Hong Kong CK Hutchison para um consórcio liderado pela BlackRock. O valor do negócio, estimado em US$ 22,8 bilhões, contempla ativos em diversos países e, em especial, os dois portos do Canal do Panamá. O anúncio ganhou ainda mais repercussão após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, declarar que seu governo estaria “reapropriando” o canal, o que gerou forte reação da Presidência do Panamá.

A notícia, divulgada originalmente pela agência Reuters, aponta que o consórcio norte-americano assumirá 90% das operações da Panama Ports Company, responsável pelas instalações de Balboa e Cristobal, situadas em pontos estratégicos de entrada e saída do Canal do Panamá. A transação, no entanto, suscita discussões sobre soberania e provoca críticas do governo panamenho, que nega qualquer tentativa de retomada do controle norte-americano sobre a via marítima.

Trump, em discurso ao Congresso norte-americano, exaltou o negócio e fez declarações contundentes: “Meu governo estará recuperando o Canal do Panamá e já começamos a fazê-lo.” Ele destacou ainda a importância de uma grande empresa dos Estados Unidos assumir o controle das operações, frisando que os portos “têm muito a ver com o Canal do Panamá e também com outros canais”.

As falas do presidente dos EUA provocaram reações imediatas. Em publicação na rede social X, o presidente panamenho, Jose Raul Mulino, rebateu Trump: “Mais uma vez, ele está mentindo. O Canal do Panamá não está em processo de ser recuperado… o Canal é panamenho e continuará sendo panamenho!” Mulino assegurou que a questão não foi discutida em reuniões recentes com autoridades norte-americanas, reforçando que o controle do canal pertence ao Panamá desde 1999, quando vigoraram os tratados que deram fim à presença administrativa dos Estados Unidos na zona.

O negócio é considerado um passo estratégico para a BlackRock e seus parceiros, que passam a controlar 43 portos espalhados por 23 países. Pelo acordo, o conglomerado CK Hutchison receberá um total superior a US$ 19 bilhões, valor que inclui a quitação de empréstimos de acionistas. A venda surpreendeu o mercado e causou forte alta das ações da empresa na bolsa de Hong Kong, subindo mais de 20% em um único dia.

Para a CK Hutchison, a negociação é explicada como uma decisão de cunho “puramente comercial”, conforme enfatizou Frank Sixt, codiretor administrativo do conglomerado. Ele negou qualquer motivação política em meio aos frequentes atritos entre Estados Unidos e China, já que a companhia é sediada em Hong Kong. A posição, porém, não impediu que analistas do JPMorgan classificassem a operação como “oportunista”. Além disso, citam que o valor obtido é consideravelmente maior do que o esperado pelo mercado, levando CK Hutchison a um status de caixa robusto.

O Canal do Panamá continua a ser uma das rotas marítimas mais importantes do mundo, conectando 1,9 mil portos em 170 países. Somente no ano passado, cerca de 12 mil navios atravessaram suas eclusas, o que coloca a via em posição estratégica para o comércio mundial, especialmente para embarcações norte-americanas. Historicamente, a presença dos Estados Unidos no canal gerou descontentamentos na sociedade panamenha, principalmente diante dos episódios de 1964, quando protestos estudantis foram duramente reprimidos na zona do canal.

Após a divulgação do acerto, a perspectiva é de que a transição do controle aconteça de forma gradativa, sem alterar de imediato as operações portuárias nem os acordos de neutralidade e livre navegação pelo Canal do Panamá. Autoridades locais e especialistas em comércio internacional, contudo, estarão atentos ao desenrolar das discussões geopolíticas que o anúncio trouxe à tona, sobretudo diante das tensões cada vez mais evidentes entre Estados Unidos e Panamá.

A venda, somada aos atritos discursivos de Trump, eleva o grau de incerteza sobre os rumos do canal, mas também abre espaço para reflexões sobre a soberania panamenha e a crescente influência de grupos de investimento norte-americanos no cenário global de infraestrutura. A repercussão imediata reforça a relevância do Canal do Panamá como uma peça-chave no tabuleiro geopolítico e, ao que tudo indica, esse movimento de “reapropriação” pode ser apenas o capítulo inicial de uma história que ainda terá muitos desdobramentos.

Por Brasil 247

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