RESERVA DE 20% DAS VAGAS NO PARLAMENTO PARA MULHERES NÃO É CONSENSO

Os senadores da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) divergiram, nesta quarta-feira (28), sobre as propostas para incentivar a participação de mulheres na política, entre elas, a que reserva 20% das vagas nos parlamentos federal, estaduais e municipais para as mulheres. A regra valeria por 20 anos.

A proposta consta no projeto de lei complementar (PLP) que cria novo Código Eleitoral, com quase 900 artigos e que unifica sete legislações em vigor. A votação foi adiada mais uma vez hoje, após pedido de vista na CCJ do Senado.

Segundo a proposta, só poderiam entrar na cota de 20% a candidata que tenha, no mínimo, conquistado 10% do quociente eleitoral definido em cada eleição. O quociente eleitoral é uma média calculada com base no número de votos válidos e de vagas disputadas e usada para evitar que pessoas com poucos votos assumam uma cadeia no Legislativo. 

O PLP 112/2021 ainda estabelece novas regras para prestação de contas de campanhas; impõe quarentena de quatro anos para policiais, juízes e militares se candidatarem e regulamenta a propaganda eleitoral na internet.

O projeto também fixa prazo de inelegibilidade de oito anos para condenados pela Lei da Ficha Limpa; estipula regras para fiscalização das urnas eletrônicas; proíbe disparo em massa de mensagens nas redes sociais e cria regras mais rígidas para divulgação de pesquisas de intenção de votos, apesar de liberar a divulgação de pesquisa no dia anterior do pleito, o que hoje é proibido.

Mulheres na política

O relator da matéria, senador Marcelo Castro (MDB-PI), defendeu a reserva de 20% de cadeiras nos parlamentos, argumentando que mais de 700 municípios no país não têm representação feminina no legislativo e outras 1,6 mil cidades só têm uma mulher nas câmaras de vereadores.

“Toda reunião que houver tratando de política, em qualquer município do Brasil, terá no mínimo duas mulheres. Essas mulheres servirão de exemplo para as outras mulheres. Elas terão um mandato, terão visibilidade, terão assessoria, terão emenda parlamentar”, justificou.

O senador Dr. Hiran (PP-RR) afirmou que não há apoio para esse tipo de mudança e defendeu apenas outros estímulos para participação feminina na política, como reserva de recursos para campanha.  

“A opinião pública não conseguirá entender que um estado com 10 vagas para deputados federais tenha duas mulheres que não tiveram votação significativa e elas representem a sociedade que votou em homens com votação muito maior. Isso é muito complicado e fere o princípio da representatividade de muitos de nós aqui”, destacou.

O senador Espiridião Amim (PP-SC) disse que o raciocínio do senador Hiran deve ser considerado, acrescentando que a mudança fere o princípio da representação de uma pessoa, que é o voto. 

Ao mesmo tempo, sustentou que é preciso estimular a mulher a ter maior participação na política.

 “Isso é um déficit cultural. Quem é que quer cota para alguma coisa? Ninguém quer, mas precisa. É preciso para o negro, para as minorias. Por quê? Porque eles não estavam acostumados a disputar eleição. A mulher também não”, disse.

A senadora Eliziane Gama (PSD-MA) defendeu a mudança, alegando que diversos países na América Latina têm uma representatividade feminina na política maior que o Brasil.

“Nós somos o país na 136ª na posição mundial na participação feminina. A Venezuela tem 32% de participação feminina. Nós temos algo em torno de 17% a 18%. Quando eu fui eleita deputada federal, eu fui a única mulher eleita do Maranhão, em 2014”, afirmou.

A senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS) defendeu que deveria haver paridade na política, 50% para homens e 50% para mulheres, mas disse que a proposta é um avanço.

“Gostaria de citar alguns países da América Latina que já têm paridade: México, Nicarágua, Cuba, um país todo fechado tem paridade e nós aqui, com toda essa democracia, não temos paridade. A Bolívia, o Chile e a Argentina têm paridade. E o Brasil, maior país da América Latina, não consegue nem discutir a paridade”, afirmou.

Número de candidatas

Outra mudança que gerou divergência foi a proposta de reverter a obrigatoriedade que existe atualmente aos partidos de reservar 30% das vagas de candidaturas para mulheres. As normas vigentes ainda determinam que 30% dos recursos usados nas campanhas sejam destinados a essas candidatas, regra que seria mantida pela proposta do relator.

“O fim da cota obrigatória de candidaturas, mantida a cota para candidatas de 30% dos recursos de campanha, constitucionalmente assegurada, permitirá que cada partido ou federação defina o percentual de candidatas e de candidatos, segundo a viabilidade de eleição dos respectivos candidatos a cada cargo e em cada circunscrição”, justificou Marcelo Castro.

A senadora Zenaide Maia (Podemos-RN) disse que a conquista de candidaturas mínimas não deve ser revista.

“Ninguém me convence dessa história de dizer que tem dificuldade de botar mulheres candidatas e vão tirar esses 30%. Aliás, eu não sei por que essa fixação em retirar esses 30% que a gente conseguiu, fica difícil de a gente entender isso”, criticou.

Urnas eletrônicas

O projeto de lei estabelece que compete ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) disciplinar as etapas para a votação, garantindo o direito de fiscalização aos partidos políticos, federações, Ministério Público, Congresso Nacional, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

Poderão ainda solicitar credenciamento junto ao TSE para participar da fiscalização das urnas os departamentos de tecnologia da informática de universidades e entidades privadas brasileiras sem fins lucrativos, com notória atuação relacionada à defesa da democracia. As Forças Armadas foram excluídas desse processo pelo relator.

Fake news

O título III do projeto proíbe a divulgação de fatos inverídicos, as chamadas fake news, em propaganda partidária, com previsão de multas aos candidatos que divulgarem ou compartilharem “fatos sabendo ou devendo saber serem inverídicos”.

A proposta ainda proíbe o disparo em massa de conteúdos nas plataformas digitais. “A utilização de disparos em massa para divulgar posicionamento pessoal ou conteúdo político-eleitoral não constitui livre manifestação democrática”, define a proposta.

O projeto, no entanto, permite o impulsionamento para divulgação de candidatos a partir do início do ano eleitoral “com valor limitado a 10% do limite de gastos do cargo pretendido”.

Quarentena e inelegibilidade

O projeto ainda disciplina o prazo para agentes públicos deixarem suas funções para se candidatarem, fixando em 2 de abril do ano da eleição a data para ministros de Estado, governadores e prefeitos, entre outros cargos, deixarem o posto que ocupam.

No caso de magistrados ou membros do Ministério Público, policiais federais e civis e militares, tanto da União como dos estados, o prazo da quarentena é fixado em quatro anos antes da eleição que pretende concorrer.

A proposta ainda fixa o prazo máximo de inelegibilidade para cargos políticos em oito anos, o que inclui aqueles condenados com base na Lei da Ficha Limpa. Atualmente, o prazo varia de acordo com decisão do Poder Judiciário.

Por Lucas Pordeus León – Agência Brasil

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