Relator afirmou que a Operação Lava Jato não estava em julgamento, mas destacou o inevitável caráter político das ações contra o ex-juiz e senador
O desembargador Luciano Carrasco Falavinha Souza, relator, votou contra o pedido de inelegibilidade do senador Sergio Moro (União Brasil-PR), no primeiro dia de julgamento no Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR), nesta segunda-feira (1º). Para ele, os partidos que entraram na Justiça pedindo sua cassação não conseguiram comprovar os alegados gastos excessivos na campanha, nem benefícios que ele teria obtido com exposição pública indevida. “Exagero que o Direito não admite”, afirmou quase ao fim da exposição. “Não houve abuso de poder econômico, não houve prova de caixa 2.”
A leitura terminou às 18h10. Na sequência, o desembargador José Rodrigo Sade pediu vista. A sessão vai continuar na próxima quarta-feira (3).
Além do relator, votam outros seis desembargadores. O TRE reservou, se necessário, outros dois dias para o julgamento, até a próxima segunda (8). Ou seja, o julgamento pode durar até três dias. Independentemente do resultado, a questão deverá chegar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com previsível recurso da parte perdedora.
Julgamento político?
No início da exposição, Falavinha Souza, ressaltou o inevitável caráter político do caso, mas ressalvou: “Não se vai aqui julgar a Lava Jato, seus personagens, acertos e erros”. Ele destacou o que considera efeitos positivos da operação, como recuperação de recursos, mas também apontou o fato de Moro ter aderido a um governo beneficiado, ainda durante a campanha, por algumas de suas decisões. Assim, comentou o relator no TRE-PR, seria “ingenuidade” imaginar que ele não sofreria ataques posteriormente. Ao mesmo tempo, ele afirmou que o PT tenta tirar o senador da vida política.
No extenso voto, o magistrado disse que “até as pedras sabem” que Sergio Moro não precisaria fazer pré-campanha para que seu nome se tornasse popular, pela grande exposição midiática de que já dispunha na ocasião. A menos que fosse uma eventual pré-campanha especificamente direcionada ao Senado.
Em comentário na rede social X, antigo Twitter, o comentarista Reinaldo Azevedo, ironizou o voto: “Relator do caso Moro no TSE, desembargador Luciano Falavinha, defende Moro com mais entusiasmo do que… a defesa técnica de Moro”. O jornalista Luis Nassif, do GGN, considerou “indecente” a defesa do desembargador em relação a Moro.
Mudança de partido e candidatura
O ex-juiz responde a duas ações de investigação judicial eleitoral (Aijes), protocoladas pelo PL e pela Federação Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV). Os partidos alegam prática de caixa 2, abuso de poder econômico, uso de meios de comunicação e contratos irregulares. Essas ações estão sendo julgadas em conjunto.
Até março de 2022, Moro era pré-candidato à Presidência da República pelo Podemos. Depois de apenas três meses, ele migrou para o União Brasil, tornando-se candidato ao Senado pelo Paraná. Antes disso, tentou transferência de domicílio eleitoral para São Paulo, mas teve o pedido negado pela Justiça Eleitoral.
Uma vaga em jogo
Na disputa por uma das três vagas pelo Paraná, Moro ficou à frente do então deputado Paulo Martins (PL) e do ex-governador Álvaro Dias (Podemos). De olho na vaga, Martins, jornalista de formação, tem apoio de Jair Bolsonaro. Ainda no PSC, presidiu a comissão especial da Câmara sobre o voto impresso.
Moro começou em 1996 como juiz federal. Em 2019, deixou a magistratura e aderiu ao governo Bolsonaro, como ministro da Justiça e Segurança Pública. Pediu exoneração no ano seguinte.
Primeiro dia de julgamento no TRE-PR, hoje: defesa vê ‘esquizofrenia’ e acusação aponta abuso na campanha (Foto: Reprodução/Youtube)
Em dezembro do ano passado, a Procuradoria Regional Eleitoral (PRE) paranaense emitiu parecer favorável à cassação do mandato. Quando prestou depoimento, Moro afirmou que tudo “segundo as regras” e chamou as acusações de levianas.
Super exposição
Primeiro a falar na sessão de hoje, o advogado Bruno Cristaldo, pelo PL, ressaltou a “super exposição” e a “atenção da grande mídia” que Moro teve ao ser apontado como possível candidato a presidente. E destacou o que chamou de “gasto exorbitante” na campanha, que teria ficado em torno de R$ 5,5 milhões.
Pelo PT, o advogado Luiz Eduardo Peccinin disse que o julgamento não envolvia o passado do ex-juiz ou a própria Lava Jato, mas se houve “trapaça eleitoral”. Assim, segundo ele, o atual senador teria “queimado a largada” na campanha, além de desrespeitar o limite legal de despesas. “Precisamos investigar para onde foi de fato esse dinheiro. Porque é dinheiro público”, afirmou.
“A maior dificuldade que tivemos nessa causa foi trazer a verdade”, disse o advogado da defesa, Gustavo Guedes. “Há uma esquizofrenia absoluta do dia 1 dessa ação até hoje.” Segundo ele, as petições e alegações mostram acusações e valores diferentes. “O senador Sergio Moro não se elegeu por conta de uma pré-campanha, se elegeu porque o eleitor paranaense assim queria”, acrescentou. “Tudo foi feito às claras”, disse, por sua vez, Cassio Prudente, outro advogado da defesa.
Inspeção na 13ª Vara
Segundo Marcelo Godoy, do PGE, embora haja alguma controvérsia sobre valores, “é possível apontar algumas (despesas) que são claramente destinadas ao pré-candidato. Ele teria um “benefício parcial” em relação a outros, com impulsionamento da imagem. “Não faltam indicações do TSE quanto à necessidade de modicidade de despesas de campanha.”
Além do julgamento no TRE e possivelmente no TSE, Moro tem outros problemas pela frente. A Corregedoria Nacional de Justiça terminou inspeção feita na 13ª Vara de Curitiba, que o ex-juiz comandava no auge da Operação Lava Jato. As conclusões do pente-fino serão incluídas na pauta de julgamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Por RDA