Plano contra o desmatamento: veja em 7 pontos a nova estratégia do governo para zerar a destruição da Amazônia

PPCDAm tem como intuito apoiar o cumprimento da meta de desmatamento zero na região até 2030. Plano inclui quatro eixos de ação e doze objetivos.

O governo federal lançou na segunda-feira (5) a mais nova fase do plano interministerial para frear o desmatamento na Amazônia Legal. Com a retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), o governo pretende tornar realidade o compromisso do desmatamento zero no bioma até 2030, uma das promessas de campanha do presidente Lula.

Publicado na segunda na íntegra, o documento de mais de 110 páginas trouxe quatro eixos de ação e doze objetivos para a estratégia, que é uma nova versão da implementada em 2004, durante o primeiro mandato de Lula.

“As metas do PPCDAM devem ser analisadas como um conjunto. Uma complementa a outra”, analisa Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima e ex-presidente do Ibama.

Abaixo, o g1 destrincha em 7 pontos as principais metas dessa iniciativa. Veja:

1. Aumentar ações de fiscalização

Qual é a meta? Fiscalizar 30% da área desmatada ilegalmente identificada pelo Prodes consolidado do último ano.

O que isso significa? O Prodes é o Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), considerado o mais preciso para medir as taxas anuais.

Como é impossível atualmente fiscalizar tudo o que é desmatado no bioma -só entre agosto de 2021 e julho de 2022 esse número passou de 11.500 km², o equivalente ao tamanho do Catar- o governo pretende então chegar numa taxa mais ambiciosa, esses 30%.

Atualmente, segundo cálculos do Mapbiomas, esse índice gira em torno de 6,1%. A taxa leva em conta territórios alvo de fiscalização pelo Ibama entre 2019 e 2020.

Assim, se levássemos em conta esse último relatório do Prodes (que não é o consolidado, esse geralmente sai na metade do ano) essa taxa seria equivalente a 3.450 km², uma área um pouco menor que Cuiabá (MT).

Imagem aérea de sobrevoo de monitoramento de desmatamento na Amazônia no município de Lábrea, Amazonas, realizado em 26 de março de 2022. — Foto: Greenpeace/Divulgação

“O controle do desmatamento envolve esforço vigoroso no campo do comando e controle, mas também eficácia e justiça social na destinação das terras públicas e no fomento de atividades produtivas sustentáveis, que tenham a manutenção da floresta pública como pressuposto”, afirma Suely Araújo.

2. Embargar metade das áreas desmatadas em UCs

Qual é a meta? Embargar 50% da área desmatada ilegalmente identificada pelo Prodes consolidado do último ano em Unidades de Conservação federais.

O que isso significa? O embargo ambiental é uma sanção administrativa que pode ser aplicada a áreas ou atividades que estejam sofrendo ou causando algum dano ao meio ambiente.

Assim como o Ibama, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) atua com esse tipo de atividade.

O objetivo desse processo é impedir que uma atividade degradadora continue em andamento, promovendo a regeneração do meio ambiente e viabilizando a recuperação da área destruída.

Desmatamento na Amazônia em Unidades de Conservação (em km²)

Maiores taxas foram durante o governo de Jair Bolsonaro (PL). Índice considera a Amazônia Legal.Área (em km²)

2016
Fonte: Deter/Inpe

Assim, essa meta do governo prevê a interdição de 50% da área desmatada ilegalmente nessas UCs federais, suspendendo atividades do tipo nesses locais. Aqui é importante lembrar que apesar de serem espaços territoriais protegidos, as UCs podem ter o uso indireto dos seus recursos naturais, exceto em casos previstos em lei.

E o cenário na Amazônia nos últimos anos mostra que o desmatamento subiu bastante no governo Bolsonaro nessas áreas protegidas (veja gráfico acima, que leva em conta UCs das três esferas – municipal, estadual e federal).

No novo PPCDAm, o Ministério do Meio Ambiente cita inclusive que esse aumento tem relação direta com a paralisação de atividades de fiscalização de infrações ambientais e a redução significativa do número de fiscais em todo o país.

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Esse enfraquecimento das ações de comando e controle, por sua vez, está relacionada ao aumento nas taxas de desmatamento na última década. A ausência de uma ação cautelar ou sanção ambiental fomenta a sensação de impunidade, o que, por sua vez, estimula desmatamentos maiores”.

— Trecho do novo PPCDAm do Ministério do Meio Ambiente.

3. Aumentar número de autos de infração

Qual é a meta? Aumentar em 10% o nº de Autos de Infração Ambiental julgados em primeira instância em relação ao ano passado (2022).

O que isso significa? O Auto de Infração Ambiental (AIA) é um documento prescrito por agentes fiscais (como o Ibama, ICMBio, etc.) que dá início a todo o trâmite de apuração e sanção de infrações ambientais.

A primeira instância é, como o próprio nome diz, o primeiro momento em que é julgada a validade ou não desse auto.

Como a redução significativa de agentes fez com que órgãos de fiscalização ambiental também vissem diminuir sua capacidade de responsabilizar infratores, a meta do governo tem como intuito justamente driblar essa inépcia, diminuindo a impunidade ao resolver processos pendentes de julgamento especificamente do ICMBio (aquelas infrações dentro de UCs).

Mas como a grande maioria dessas infrações são cometidas fora dessas localidades, Raul do Valle, especialista em políticas públicas do WWF-Brasil, explica que essa é inclusive uma meta não muito ambiciosa do novo PPCDAm.

“A imensa maioria do desmatamento no país acontece foram de UCs. Portanto, a maior parte dos autos são lavrados ou pelos estados ou pelo Ibama. Então, aumentar 10% dos autos do ICMBio, que já não são muitos, é uma meta bastante modesta”, diz.

g1 entrou em contato com o ICMBio para saber quantos procedimentos do tipo foram julgados em 2022 pelo órgão, mas ainda não obteve resposta.

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Vista aérea de uma área atingida por queimadas durante uma operação do Ibama para combater incêndios na Amazônia em 2019. — Foto: Vinícius Mendonça/Ibama

4. Suspender ou cancelar 100% dos registros irregulares de CAR

Qual é a meta? Suspender e/ou cancelar os registros de Cadastro Ambiental Rural de imóveis sobrepostos a Terras Indígenas e vedar novas inscrições.

O que isso significa? O CAR é um registro público obrigatório para todos os imóveis rurais. O cadastro é usado para mapear a grilagem (ocupação ilegal de terras) e fazer o controle de áreas desmatadas.

Como nos últimos anos houve uma tendência de aumento do desmatamento após a inscrição de imóveis no CAR, o objetivo dessa meta do PPCDAm é suspender e/ou cancelar o cadastro dessas propriedades rurais irregulares.

No ano passado, por exemplo, 54% do desmatamento da Amazônia ocorreu dentro de imóveis rurais inscritos no CAR, de acordo com dados do Prodes.

Por isso, para do Valle, a meta do governo é bastante relevante, visto que a medida pode impedir que o cadastro seja utilizado ilegalmente para a grilagem de terra e, consequentemente, o desmatamento.

Agora resta saber se de fato o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos irá coordenar a ação, tendo em vista que o MMA perdeu o controle do CAR com a aprovação da MP que reestruturou ministérios no governo Lula. Sobre isso, o g1 questionou o Ministério do Meio Ambiente, mas ainda não obteve resposta.

“A regularização fundiária é bem importante porque aqueles que têm direito de ocuparem terras há muito tempo de forma mansa e pacífica, respeitando os critérios ambientais, devem ter os seus direitos reconhecidos sobre essa terra. Esse é um processo que precisa ser feito”, afirma Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas.

5. Incorporação de 100% das terras devolutas à União

  •  Prazo: 2027
  • 📃 Principal órgão responsável: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e Secretaria de Governança Fundiária e Desenvolvimento Territorial e Sustentável do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA)

Qual é a meta? Incorporar 100% das terras devolutas ao patrimônio da União.

O que isso significa? Terras devolutas são áreas públicas sem destinação pelo poder público e que nunca fizeram parte do patrimônio privado, mesmo que estejam sob a posse irregular de particulares.

Assim, a meta do governo é identificar, demarcar e incorporar esses territórios, que respondem por 15% da Amazônia e são o principal foco de desmatamento na Amazônia.

Para se ter ideia, somente o Amazonas tem 58,2 milhões de hectares de terras públicas sem destinação, o equivalente a mais de cinquenta vezes o tamanho da cidade de Manaus, conforme mostrou um estudo do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) de 2021.

Em 2022, o Amazonas liderou inclusive o ranking dos nove estados que compõem a Amazônia Legal com a maior área de desmatamento em terras públicas não destinadas: 49,27% do desmatamento ocorrido no período, segundo dados do próprio ministério.

“A única forma de acabar com isso, é incorporando essas terras no patrimônio da União para que elas possam ser destinadas e evitem ser griladas”, acrescenta do Valle.

6. Destinar cerca de 29,5 milhões de hectares de florestas públicas

Qual é a meta? Destinar 29,5 milhões de hectares de florestas públicas federais ainda não destinadas.

O que isso significa? Na região da Amazônia, hoje temos aproximadamente 57 milhões de hectares de florestas públicas não destinadas.

Isto é, terras que estão sob domínio do governo federal ou de algum governo estadual e ainda não receberam destinação para se consolidar como terra indígena, unidade de conservação ou outro tipo de área protegida.

Na prática, isso faz com que ainda restem mais de dois estados de São Paulo em extensão, compostos por terras públicas federais sem destinação específica na região, conforme destacou João Paulo Ribeiro Capobianco, secretário-executivo do MMA, em entrevista ao portal “((o))eco”.

Como dar uma destinação específica para áreas que ainda não possuem um uso definido, como as florestas não destinadas, ajuda a combater a grilagem de terras, com essa meta, o objetivo do governo então é regularizar essas áreas e consequentemente enfrentar o desmatamento nessas localidades.

7. Criar 3 milhões de hectares de unidades de conservação

Qual é a meta? Criar 3 milhões de hectares de unidades de conservação.

O que isso significa? Atualmente, a Amazônia Legal tem 145 UCs, segundo dados do Instituto Socioambiental.

Isso equivale a mais ou menos 67 milhões de hectares de territórios que incluem florestas nacionais, reservas extrativistas e áreas de proteção ambiental.

A meta do PPCDAm então é chegar perto dos 70 milhões até 2027, estabelecendo a criação de UCs principalmente em áreas críticas de desmatamento na região.

“A meta dos 3 milhões de hectares de unidades de conservação deve ser compreendida no âmbito de um esforço maior que envolve, também, a consolidação das áreas protegidas já existentes”, avalia Suely Araújo, do Observatório do Clima.

Por: G1

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