A dor de uma mãe encontrou voz em um grito de desespero e revolta: “O policial arrastou o meu filho pela escada!” A frase é de Mônica Guimarães Mendes, mãe de Herus Guimarães Mendes, de 24 anos, morto na madrugada do último sábado (7), durante uma operação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), na comunidade do Santo Amaro, no Catete, zona sul do Rio. Herus foi baleado durante uma tradicional festa junina no local.
Segundo Mônica, o filho foi atingido quando estava em frente a uma padaria, tentando comprar um lanche.
“Ele me perguntou se eu queria algo para comer. Saiu com o celular na mão, com o Pix aberto para pagar. Foi quando levou o tiro na barriga. Ele colocou a mão no ferimento e caiu, ali mesmo, na calçada”, contou, em lágrimas.
Ela afirma que, mesmo ferido, o filho não recebeu socorro imediato. “O policial arrastou o meu filho pela escada e gritou que ele era vigia do tráfico. Colocou uma grade em volta do corpo dele para impedir qualquer ajuda. A gente tentou socorrer, mas eles não deixaram”, disse. Segundo testemunhas, Herus permaneceu caído por vários minutos antes de ser colocado em um carro particular. “Quando levamos o Herus para o carro, eles ainda debocharam”, completou Mônica.
Herus morreu no hospital horas depois
O jovem foi levado ao Hospital Glória D’Or, próximo à comunidade, mas não resistiu aos ferimentos. Herus era conhecido na região como um rapaz tranquilo e trabalhador. “Ele foi criado com tanto amor. Eu fiz de tudo para ele não entrar nessa vida [do crime]. Vigiei, orientei, protegi. E agora a polícia, que deveria cuidar da gente, tirou a vida do meu filho!”, desabafou Mônica, revoltada com o que considera uma execução sumária.
Clamor por justiça
O caso provocou comoção na comunidade e acendeu novamente o debate sobre a letalidade das operações policiais em áreas urbanas, especialmente quando realizadas em contextos de lazer e confraternização popular, como festas juninas.
A Polícia Militar informou, por meio de nota assinada pelo secretário da corporação, coronel Marcelo de Menezes Nogueira, que a conduta dos policiais envolvidos será investigada.
“A execução da operação será apurada no curso das investigações. Todas as testemunhas serão ouvidas, as perícias realizadas. O resultado das perícias e as imagens das câmeras corporais vão nos permitir uma elucidação clara do que de fato ocorreu naquela madrugada”, declarou.
Violência em meio à festa
Testemunhas relataram que a ação do Bope surpreendeu os moradores em meio às comemorações juninas, sem aviso prévio. A festa, que reunia dezenas de famílias, foi interrompida por gritos, tiros e correria. “Parecia guerra. Gente correndo com criança no colo, som desligado às pressas, tudo no susto. A comunidade inteira está em choque”, disse uma moradora, que preferiu não se identificar.
Histórico de Herus e a marca da violência
Herus não tinha passagem pela polícia e, segundo a família, estava em um momento de reconstrução de vida, após perder o pai meses antes. Ele havia conseguido um novo emprego e morava com a mãe. “Era meu único filho. Eu lutei tanto para não enterrá-lo. Mas hoje estou aqui, enterrando não só meu filho, mas a minha esperança”, lamentou Mônica.
A Defensoria Pública e entidades de direitos humanos acompanham o caso e cobram uma apuração rápida e transparente. “O que ocorreu em Santo Amaro precisa ser investigado com rigor. Não podemos normalizar mortes de jovens negros em ações policiais mal conduzidas”, afirmou um representante da Comissão de Direitos Humanos da OAB-RJ.
Enquanto a investigação tenta montar o quebra-cabeça daquela noite, Mônica, como tantas outras mães no Brasil, vive o luto solitário e a busca por justiça.
“Quero justiça. Só isso. Que a morte do meu filho não seja mais uma estatística esquecida.”
Por Gazeta Rio/Ricardo Bernardes