Por Ricardo Bernardes
E não é que Ipanema ganhou um novo frequentador? Mas nada de turistas perdidos com camiseta de seleção ou vendedores de mate atravessando a areia como se fossem maratonistas. Desta vez, quem roubou a cena foi um lobo-marinho. Veio lá da Antártida, num freestyle digno de medalha olímpica, e desembarcou diretamente no metro quadrado mais caro do planeta. Como todo bom carioca honorário, escolheu um canto na areia e se espalhou sem cerimônia.
Não demorou para que ganhasse um nome. Batizaram-no Joaquim, mas no Rio de Janeiro é assim: nome completo é só pra RG. Virou Joca. E Joca ficou. Entre selfies e hashtags, o lobo-marinho parecia ter nascido ali, no coração do Rio, embora carregasse no olhar um leve “deixe-me em paz” digno de quem já viveu o suficiente para ignorar paparazzi.
A verdade é que Joca se apaixonou pela vida carioca. Depois de anos congelado na Antártida, viu que ali, ao som do samba misturado ao vai e vem das ondas, era o lugar ideal para pendurar as nadadeiras. Entre um mergulho e outro, dava uma olhada nas “garotas de Ipanema”, aquelas cantadas em verso e prosa. Certamente pensou: “Tom e Vinicius estavam certos. Aqui é melhor que o Pólo Sul”.
Mas como todo morador do Rio sabe, viver aqui não é para amadores. Imaginem se o Joca resolvesse pegar um transporte público para explorar a cidade. Na Avenida Brasil, trombando com o Caveirão em pleno tiroteio – aí o lobo-marinho se transformava em lobo-mártir. Ou, quem sabe, indo até Honório Gurgel e descobrindo que a Águas do Rio está “consertando” uma adutora – como sempre, às custas das torneiras secas e de um calor de 40 graus. Melhor mesmo ficar em Ipanema, com os pés na areia e o espírito na sombra.
Nas redes sociais, é claro, surgiram teorias conspiratórias. Uns disseram que Joca era espião do Lula, mandado para monitorar a elite carioca. Outros, que não passava de um agente chinês, com uma microcâmera escondida nas nadadeiras. Trump, do alto de sua paranoia, sugeriu que o lobo-marinho poderia ficar até o dia de sua posse – ou seria deportado. Joca, no entanto, ignorava as fofocas com a altivez de quem não tem conta no Twitter.
Para alguns, sua presença era uma jogada de marketing. Diziam que uma cervejaria planejava colocar Zeca Pagodinho ao lado do bichinho em um comercial – nada mais carioca do que isso. Outros sugeriam que ele era, na verdade, um manifesto silencioso contra o aquecimento global. E havia, claro, aqueles que o viam como uma reencarnação de Tom Jobim, voltando para inspirar novas canções.
Se pensou em mudar de ares, foi apenas por um instante. São Paulo? Nem pensar! Arriscava acabar em um valão no Tietê, confundido com um pé de meia gigante. Minas? Sem mar, sem chance. Em Ipanema, ele tinha tudo: calor, mar, e um certo charme despretensioso. Era sua Pasárgada, como diria Manuel Bandeira, mas com caipirinhas e biquínis.
Há quem sugira que Joca peça asilo e vire cidadão brasileiro. Com um pouco de sorte, quem sabe não ganha uma estátua na praia? Embora, como lobo-marinho, seu destino mais natural seja virar lama – ou, no máximo, areia. Mas até lá, Joca segue vivendo seu conto de fadas tropical. Entre o sol e o mar, ele nos lembra que, mesmo em tempos difíceis, a vida é melhor com um pouco de sal. E talvez, com um lobo-marinho de estimação.
Ricardo Bernardes (jornalista e educador)