O Rio de Janeiro é visto como um dos estados mais avançados quanto a direitos da comunidade LGBTQIAP+. Entretanto, na Baixada Fluminense, a realidade é outra: não há, em nenhum município da região, ambulatórios especializados que atendem as demandas de pessoas transgêneros, travestis e não binárias.
Alguns dos serviços oferecidos por esses tipos de ambulatórios podem incluir hormonização, cirurgias de afirmação de gênero e atendimentos integrados, como de psicologia e serviço social.
Moradores relatam que, ao procurar por atendimento para procedimentos de hormonização nas unidades básicas de seus municípios, são encaminhados para o Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia Luiz Capriglione (IEDE), localizado na cidade do Rio de Janeiro, referência no estado.
Dificuldade econômica e improvisos perigosos
Devido à falta de acesso, algumas pessoas recorrem à rede privada, o que pode ser inacessível para a maioria. Além das consultas, é preciso pagar exames e o próprio medicamento. No caso de quem usa a testosterona, por exemplo, ela sofreu uma alta abrupta nos últimos tempos.
Muitas pessoas trans que estão fora do mercado de trabalho –, o que é comum a essa população –, acabam por fazer o uso de hormônios sem o acompanhamento médico, o que pode causar graves problemas à saúde.
Oliver Taylor, homem trans, 23 anos, morador da Vila Tiradentes, em São João de Meriti, vive essa situação. “Para quem, no momento, não está trabalhando, não tem condição de ir para o Centro do Rio, fica complicado. É como se a pessoa trans que mora na Baixada, em lugares periféricos, não existisse.”
Aslan Rodrigues, homem trans, 29 anos, DJ e morador de Duque de Caxias, no Bairro Laureano, conta que vê muita dificuldade no atendimento à população trans, seja especializado ou em qualquer outra questão de saúde. Ele procurou em diversos bairros e não encontrava atendimento. “Passamos por uma barra enorme e constrangimento, que é chegar dentro de um consultório médico e ser tratado até mesmo como se fosse de outro mundo.”
Ele sente que Caxias ainda é atrasada em muitos aspectos. “Temos que gastar muito dinheiro de passagem, tendo que buscar respostas e ajuda em outro município. Então tudo fica muito difícil.”
Ir ao médico em horário de trabalho gera até demissão
Bernardo, 34 anos, mora em Nova Iguaçu. Ele relata que enfrentou obstáculos não só na procura de hormonização, mas também na retificação de nome e gênero nos seus documentos. Quando, pela primeira vez, procurou atendimento, esperou muito tempo por uma consulta, para sair dela frustrado: recebeu a notícia de que não faziam esse tipo de acompanhamento.
Bernardo reclama que gasta muito dinheiro com passagens para ser atendido na capital, além dos gastos com alimentação, quando tem consultas e exames. Também cita pessoas que trabalham e não conseguem conciliar emprego com o acompanhamento de saúde em outra cidade.
O seu chefe já descontou do seu salário, por ter se atrasado no trânsito entre Nova Iguaçu e Rio de Janeiro, quando teve atendimento no IEDE, mesmo com o atestado médico de comparecimento.
“Quem trabalha em horário comercial, simplesmente vai ter que faltar do trabalho toda vez. E aí já viu, né? Tem empresa que usa isso como critério para demitir funcionário.”
Por: Dhiego Monteiro