Oficiais militares de Israel reconheceram, em caráter reservado, que a população palestina na Faixa de Gaza enfrentará fome generalizada caso a entrada de ajuda humanitária não seja restabelecida nas próximas semanas, informa O Globo. Durante meses, o governo israelense sustentou que o bloqueio de alimentos e combustíveis em Gaza não representava uma ameaça significativa à população civil, mesmo diante de alertas da ONU.
Análises internas feitas por militares que monitoram a situação humanitária indicam que muitas regiões do território não terão alimentos suficientes para atender às necessidades nutricionais básicas se o bloqueio continuar. Como a retomada da ajuda leva tempo até se estabilizar, esses oficiais destacaram a urgência de uma ação imediata para evitar que o sistema de distribuição colapse totalmente.
O reconhecimento da crise dentro das forças armadas ocorre no momento em que o primeiro-ministro Binyamin Netanyahu promete intensificar a ofensiva militar contra o Hamas. Na terça-feira (13), ele declarou que o Exército retomaria os combates “com força total” para “terminar o trabalho” e “eliminar o Hamas”.
O agravamento da crise humanitária também foi destacado na segunda-feira (12) por um alerta da Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar (IPC), iniciativa apoiada pela ONU. Segundo o relatório, a fome é iminente, e se os combates continuarem, “a vasta maioria da população de Gaza ficará sem acesso a comida, água, abrigo e medicamentos”.
De acordo com os relatos, grande parte das padarias foi forçada a fechar, cozinhas solidárias deixaram de operar, e os estoques do Programa Mundial de Alimentos das Nações Unidas foram esgotados. A situação levou à disparada dos preços: o custo da farinha, por exemplo, aumentou 60 vezes desde fevereiro, o que resultou em saques em várias regiões.
Moradores relatam extrema escassez. Khalil el-Halabi, de 71 anos, ex-funcionário da ONU em Gaza, afirmou estar se alimentando com restos enlatados vencidos. “Tudo o que comi hoje foi um pouco de fava de uma lata vencida”, disse. Ele relatou ter perdido 36 quilos desde o início da guerra. Sua filha, que deu à luz recentemente, não consegue amamentar por falta de nutrição adequada, e não há leite em pó disponível, segundo ele.
A resposta oficial de Israel permanece cautelosa. O Ministério da Defesa e o Exército não comentaram os alertas sobre a fome. O porta-voz da chancelaria israelense, Oren Marmorstein, disse que não poderia divulgar discussões internas, mas que o governo está “em contato diário com todas as agências relevantes”.
As restrições israelenses à entrada de ajuda humanitária, endurecidas desde março, são alvo de crescentes críticas internacionais. O chefe humanitário da ONU, Tom Fletcher, em discurso no Conselho de Segurança, acusou Israel de impor “deliberadamente e sem pudor” condições desumanas. “Do que mais vocês precisam?”, questionou. “Vão agir — de forma decisiva — para prevenir um genocídio? Ou dirão que ‘fizeram tudo o que podiam’?”
Em resposta à crise, o governo israelense avalia formas alternativas de distribuir ajuda, sem envolvimento direto do Hamas. A proposta inclui o uso de empresas privadas e vigilância das Forças Armadas de Israel. No entanto, a ONU rejeitou o plano, alegando que ele restringiria os pontos de distribuição, aumentaria os riscos para os civis e forçaria longas caminhadas — afetando especialmente crianças, idosos e pessoas com deficiência.
A justificativa de Israel é que o bloqueio busca impedir o Hamas de interceptar e revender ajuda destinada à população. Segundo uma autoridade da defesa, enfraquecer o grupo por meio do controle de suprimentos pode pressioná-lo a libertar os reféns capturados em 7 de outubro de 2023, quando o conflito foi deflagrado.
Por Redação Brasil 247