Foi no Dia das Mães do ano passado, sentado numa praça da Ilha de São Vicente, em Cabo Verde, na África, que Lázaro Ramos colocou o ponto final em “Na nossa pele” (Editora Objetiva, 128 páginas, R$ 69,90). No novo livro, ele dá continuidade ao diálogo iniciado com o leitor em “Na minha pele”, lançado em 2017.Fala sobre o ofício de artista, de questões raciais, de afeto e de transformações sociais no tocante à representatividade negra, entrelaçando com reflexões pessoais. Desta vez, porém, uma personagem especial se faz mais presente: Célia Maria do Sacramento, falecida quando ele tinha 19 anos. Tanto que, a princípio, as peles do título seriam de mãe e filho.
— É uma homenagem, uma maneira de ser justo com ela. Muitas das memórias que eu tinha de minha mãe tinham a ver com dor, porque ela sofreu muito. E assim eu a descrevia. Aí eu fui fazer uma investigação, pesquisar quem foi essa mulher incrível. Ela era alegre, inteligentíssima, talentosa, criativa… Precisou silenciar diante do sofrimento pelo sustento, para pagar as contas — detalha Lázaro sobre Célia, que trabalhava como doméstica e chegou a ser agredida pela empregadora: — Quero que este livro traga as pessoas para perto, que acolha. É uma obra sobre vulnerabilidade, dúvidas, desafios, mas sempre numa perspectiva de, no final da leitura, abrir caminhos, alternativas. Eu não quero desanimar ninguém, quero oferecer possibilidades.
Ao examinar a personalidade e a história de sua mãe, Lázaro identificou semelhanças suas com ela. — Por exemplo, o gosto pela conversa. O meu tipo de humor é muito parecido com o dela também, assim como a minha vulnerabilidade. Eu era muito jovem quando ela faleceu, foi pouco tempo de convivência. Ela foi uma ausência presente o tempo todo. A até três anos atrás, eu entrava no supermercado, via o biscoito de que ela mais gostava e meus olhos lacrimejavam. Poder me enxergar nela e ao mesmo tempo me ver como uma extensão dela é bonito. O carinho e o estímulo que ela e meu pai me deram me fez ter coragem para desbravar caminhos, tendo oportunidades que ela não teve — afirma ele, aos 46 anos, corrigindo uma informação muitas vezes repetida em entrevistas: — Durante anos, me perguntavam se eu sou o primeiro artista da minha família e eu dizia que sim.
por G1