INEA IDENTIFICA CONCENTRAÇÃO DE SUBSTÂNCIA 2 VEZES MAIOR EM EMPRESA INVESTIGADA POR DETERGENTE NO GUANDU

Cedae interrompeu o abastecimento ao detectar surfactante no manancial. O g1 apurou que os órgãos ambientais do estado estudam aplicar até R$ 50 milhões de multa na empresa Burn, que nega que o detergente saiu de suas instalações.

Técnicos do Instituto Estadual do Ambiente (Inea) afirmam que identificaram uma quantidade de surfactantes (agentes químicos que aumentam a solubilidade efetiva dos compostos orgânicos na água) duas vezes maior do que a permitida por lei na galeria de águas pluviais da empresa Burn Indústria e Comércio. A fábrica localizada em Queimados, na Baixada Fluminense, é investigada por jogar detergente no rio Guandu e provocar a suspensão do abastecimento de água no Rio de Janeiro.

Na última segunda-feira (28), a Cedae interrompeu o abastecimento de água a partir da Estação de Tratamento (ETA) Guandu, que atende 11 milhões de pessoas na Região Metropolitana do estado.

A companhia identificou vários focos de espuma branca no manancial e, para garantir a segurança hídrica da população, decidiu fechar preventivamente a captação das piscinas de filtragem, desviando a água suja para as comportas da descarga.

A captação ficou paralisada por 14 horas e provocou instabilidade na distribuição de água no RJ por 72 horas. O g1 apurou que os órgãos ambientais do estado estudam aplicar até R$ 50 milhões de multa na Burn.

Crime ambiental

Na última segunda, a Gerência de Informações Hidrometeorológicas e de Qualidade das Águas (GEIHQ) do Inea, identificou a presença elevada de surfactantes, uma substância presente na formulação de detergentes, na empresa Burn.

Os surfactantes são tecnicamente chamados de “MBAS”, ou “substâncias tensoativas que reagem ao azul de metileno”. A legislação brasileira permite o máximo de 2,00 mg por litro de água. Contudo, a amostra coletada na galeria de águas pluviais da Burn contava com 4,21 mg de MBAS por litro.

“O parâmetro MBAS está diretamente relacionado às substâncias surfactantes (detergentes), que foi o gerador da espuma observada no rio Guandu e que ocasionou a paralisação de captação da ETA Guandu. Mediante o exposto, resta claro que a empresa Burn contribui significativamente para o evento observado no rio Guandu, no dia 28/08/2023”, dizia um trecho do laudo do Inea.

De acordo com a legislação estadual, a quantidade da substância encontrada na galeria pluvial da empresa configura crime ambiental, conforme relatou o Inea.

A fiscalização na empresa de Queimados contou com a participação da Diretoria de Pós-Licença (DIPOS) e da Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA).

Polícia pede interdição

Na terça, a Polícia Civil pediu à Justiça que a empresa seja interditada. O Governo do Rio informou que a empresa não tinha autorização para jogar resíduos no rio.

A substância despejada no rio formou uma espessa espuma no manancial, o que levou a Cedae a interromper o fornecimento de água tratada.

A Burn Industria e Comércio LTDA fica localizada no Parque Industrial de Queimados. A fábrica tem licenças para fabricar cosméticos, produtos de perfumaria e de higiene pessoal. Além de produzir sabões, detergentes sintéticos e desinfestantes domissanitário.

Segundo fontes da Prefeitura de Queimados, há 12 dias atrás a Secretaria Municipal de Meio Ambiente local e o Inea estiveram na empresa, apurando uma denúncia de descarte irregular de produtos químicos. Não foi constatado, entretanto, problemas nesse sentido, apenas questões de documentação, que foram sanadas dias depois.

Segundo o Inea, nos últimos 5 anos, na região hidrográfica do Guandu, o instituto identificou dezenas de irregularidades em indústrias e aplicou 18 multas que somam mais de R$ 3,2 milhões devido a riscos ao sistema de abastecimento.

O órgão não informou se essas autuações foram quitadas. A maior preocupação, no entanto, é com atividades não passíveis de licenciamento ambiental, como o despejo irregular de esgoto doméstico sem tratamento, num cenário de baixos índices de coleta e tratamento desses efluentes.

Após 14 horas de paralisação, a Cedae voltou a realizar a captação de água no Rio Guandu, às 19h30 desta segunda-feira (28). Apesar da captação de água ter sido retomada, as empresas responsáveis pela distribuição da água precisarão de até 72 horas para normalizar o abastecimento em toda Região Metropolitana.

A concessionária Águas do Rio informou na noite desta segunda-feira que a paralisação do sistema Guandu impactou o abastecimento de água da capital e Baixada Fluminense (Nova Iguaçu, Duque de Caxias, São João de Meriti, Belford Roxo, Queimados e Mesquita) nas áreas sob responsabilidade da empresa. São quase 300 bairros afetados na região, segundo a companhia.

O que diz a Burn

A empresa se pronunciou através da seguinte nota:

“A Burn esclarece que não há nenhuma relação entre a sua fábrica de Queimados, na Baixada Fluminense, e a presença de material químico na bacia do Rio Guandu. A unidade opera com tecnologia de ponta e de padrão internacional, seguindo os mais rigorosos procedimentos de controle, onde o manuseio da matéria-prima é automatizado e em ambiente de circuito fechado, ou seja, sem qualquer escoamento ou ligação com a rede pluvial. Além disso, tem todas as licenças necessárias e destinação ambientalmente correta de seus resíduos, estando sob monitoramento e controle permanentes dos órgãos ambientais competentes. Cabe ressaltar que a fábrica está a 11 quilômetros de distância do sistema do Guandu seguindo o fluxo do rio, e adota uma série de iniciativas sustentáveis, como sistema de reuso de água da chuva, iluminação por fontes renováveis e selo EU Reciclo. A empresa também contratou laboratório especializado para coleta e análise da água e está colaborando com as investigações, à disposição das autoridades”.

Por Rafael Nascimento, Raoni Alves, g1 Rio

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