Estudo da USP mostra que a taxação dos super-ricos pode viabilizar uma correção neutra em termos fiscais da tabela do Imposto de Renda
Uma nova proposta de imposto mínimo para milionários no Brasil, combinada com a correção da tabela do Imposto de Renda para Pessoas Físicas (IRPF), poderia gerar um impacto significativo na arrecadação e contribuir para a redução da desigualdade no país. Segundo um estudo do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made-USP), a adoção de uma alíquota mínima de 12% para quem ganha mais de R$ 1 milhão ao ano poderia arrecadar até R$ 65,9 bilhões. Se a alíquota fosse de 15%, esse valor subiria para R$ 90 bilhões.
O estudo, antecipado à Folha de S. Paulo, aponta que, ao mesmo tempo, a correção da faixa de isenção do IRPF para R$ 5 mil mensais, uma promessa de campanha do presidente Lula (PT), beneficiaria uma faixa significativa da população, especialmente aqueles que recebem entre R$ 3 mil e R$ 29 mil por mês. A depender da proposta adotada, o impacto sobre a arrecadação pode ser compensado pela taxação dos milionários, garantindo que a reforma seja neutra em termos fiscais.
Guilherme Klein Martins, professor da Universidade de Leeds no Reino Unido e pesquisador do Made-USP, destaca a relevância da medida para aumentar a progressividade do sistema tributário brasileiro, que atualmente penaliza os mais pobres. “Essa medida por si só pode ser muito efetiva para melhorar a progressividade do sistema brasileiro”, afirma Martins. Ele aponta que, enquanto os brasileiros mais ricos pagam proporcionalmente menos impostos, as camadas mais baixas da população acabam arcando com a maior parte da carga tributária.
O estudo da USP traz duas simulações principais. A primeira considera um projeto de lei em tramitação no Congresso que propõe a isenção do IRPF para rendas até R$ 5,2 mil, mantendo as atuais quatro faixas de tributação. Nesse cenário, a perda de arrecadação seria de R$ 135,8 bilhões. A segunda proposta prevê uma isenção até R$ 5 mil, com uma única alíquota de 27,5%, resultando em uma perda de R$ 90,9 bilhões. Ambas as perdas poderiam ser compensadas pela criação do imposto mínimo para milionários.
Atualmente, muitos dos rendimentos dos mais ricos são isentos de tributação, como os lucros e dividendos, o que reduz a alíquota efetiva paga por eles para menos de 5%. Martins ressalta que essa situação é insustentável diante da crescente desigualdade no país. “O aumento da progressividade do sistema é muito bem-vindo. O imposto mínimo, sem dúvida, é uma forma engenhosa de fazer isso”, complementa o pesquisador.
Além disso, o estudo revela que a aplicação das medidas sugeridas pelo Made-USP poderia reduzir em 0,3% o índice de Gini, indicador utilizado para medir a desigualdade de renda. A expectativa é de que até 20% da população, especialmente a classe média, seja beneficiada com as mudanças na tabela do IRPF.
Embora a proposta de criação de um imposto mínimo sobre os milionários esteja em estudo pelo Ministério da Fazenda, liderado por Fernando Haddad (PT), o governo ainda não tomou uma decisão final. Haddad sinalizou que a reforma da renda pode ser adiada para 2025, mas o presidente Lula já se posicionou a favor da taxação dos mais ricos para financiar a correção da tabela do IRPF.
Essas mudanças estão em linha com as discussões internacionais sobre a necessidade de uma maior cooperação para evitar a evasão fiscal por parte dos super-ricos. O Brasil tem defendido essa pauta em fóruns como o G20, buscando garantir que a arrecadação de impostos seja justa e eficiente.
O estudo da USP sugere que, apesar das possíveis tentativas de planejamento tributário para evitar a nova taxação, a Receita Federal está preparada para monitorar grandes variações nos rendimentos dos milionários. Esse acompanhamento será essencial para o sucesso da implementação de um imposto mínimo progressivo.