Ação civil pública denuncia tentativa de desregulamentação do setor, ameaçando o direito à saúde e à proteção do consumidor
O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal de São Paulo para anular a Resolução Normativa nº 621/2024 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que instituiu o ambiente regulatório experimental conhecido como sandbox no setor de saúde suplementar. Para o Idec, a iniciativa abre espaço para a criação de planos de saúde precarizados, com coberturas extremamente limitadas e sem garantia de atendimento hospitalar, o que coloca em risco direitos fundamentais dos consumidores.
O Idec aponta que a Resolução foi editada sem a necessária Avaliação de Impacto Regulatório (AIR), contrariando exigências da legislação brasileira. Além disso, a entidade destaca que a norma foi utilizada como base para a abertura da Consulta Pública nº 151, que propõe a criação de um “plano para consultas médicas estritamente eletivas e exames”, sem direito a internações e procedimentos de urgência. Para o instituto, trata-se de uma violação frontal à Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998), que define padrões mínimos obrigatórios de cobertura.
Risco de retrocessos e favorecimento a interesses privados
Na ação, o Idec também denuncia a existência de conflitos de interesse, citando que o então diretor-presidente da ANS, Paulo Rebello, que aprovou a normativa, deixou a autarquia poucos meses depois para assumir posição em empresas do setor de saúde suplementar privado. O Idec alerta para a prática conhecida como “porta giratória”, em que ex-gestores públicos passam a atuar em empresas diretamente beneficiadas por suas decisões anteriores, o que compromete a credibilidade e a imparcialidade do processo regulatório.
A entidade ressalta que a tentativa de introduzir planos de saúde limitados atende a antigos pleitos de operadoras do setor, que desejam ofertar produtos mais baratos, mas sem garantir atendimento integral aos consumidores. Para o Idec, isso significa empurrar para o Sistema Único de Saúde (SUS) a responsabilidade por emergências e tratamentos de maior complexidade, gerando sobrecarga e iniquidades no sistema público.
Direito à saúde e proteção do consumidor em jogo
Na fundamentação jurídica da ação, o Idec argumenta que a medida da ANS viola diversos princípios constitucionais, como a proteção à saúde, o direito à vida e o direito à informação clara e adequada. Também sustenta que a flexibilização das coberturas mínimas cria riscos concretos para os consumidores e fere dispositivos do Código de Defesa do Consumidor, ao estimular a oferta de produtos que podem induzir o público ao erro e à contratação de serviços insuficientes para suas necessidades reais.
O Idec pede que a Justiça anule a Resolução Normativa nº 621/2024 e todos os atos dela decorrentes, especialmente a Consulta Pública nº 151. A entidade também requer que qualquer proposta de alteração regulatória no setor de saúde suplementar seja precedida de estudos técnicos robustos e de ampla participação social, conforme exigem as leis vigentes.
A iniciativa do Idec reforça o alerta sobre os riscos de um processo de desregulamentação que pode fragilizar ainda mais a proteção dos consumidores no acesso a serviços essenciais de saúde e representa um chamado à sociedade para defender a integridade do direito à saúde como valor fundamental.