FATOR DECISIVO EM SÃO PAULO FOI A REJEIÇÃO DE BOULOS, QUE NÃO CAIU ENTRE UMA ELEIÇÃO E OUTRA

Campanha com apoio ampliado e R$ 80 milhões em investimentos não conseguiu vencer barreira de rejeição ao candidato do PSOL

A rejeição elevada ao nome de Guilherme Boulos (PSOL) foi apontada como um dos principais fatores de seu desempenho em 2024, refletindo quase o mesmo percentual de votos obtido na disputa de 2020. Mesmo após a unificação dos principais partidos de esquerda e uma campanha de R$ 80 milhões, o candidato enfrentou o estigma de “invasor” e “extremista”, segundo análise de cientistas políticos e aliados do PSOL e PT ouvidos pela reportagem da Folha de S. Paulo.

Com 40,65% dos votos válidos no segundo turno, Boulos perdeu para Ricardo Nunes (MDB), que alcançou 59,35% dos votos. O cenário foi similar ao de 2020, quando o então vice de Bruno Covas (PSDB) também venceu o psolista. Em termos de campanha, porém, houve uma grande diferença: enquanto em 2020 Boulos dispôs de R$ 7,5 milhões (equivalente a R$ 9,7 milhões corrigidos pela inflação), em 2024 ele contou com mais tempo de televisão e uma verba oito vezes maior. No entanto, esses recursos não foram suficientes para reduzir a alta rejeição que ele enfrenta, medida em 52% pelos dados do Datafolha.

“Esses números mostram que, mesmo com mais de 2,3 milhões de votos no segundo turno, consolidando uma base expressiva, Boulos não conseguiu romper o teto imposto pela imagem que tem em setores de São Paulo”, afirmou Paula Coradi, presidente do PSOL. Coradi observou ainda que a campanha enfrentou dificuldades diante de “máquinas governamentais e partidárias poderosas” e uma ofensiva de ataques digitais.

Para Sérgio Praça, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), as diferenças entre os contextos de 2020 e 2024 explicam parcialmente a estagnação dos números. Enquanto a pandemia moldou o pleito anterior, a eleição de 2024 trouxe novos fatores, como a candidatura de Pablo Marçal, do PRTB, que surpreendeu com 28,14% no primeiro turno. Praça também criticou a estratégia digital da campanha de Boulos, que, segundo ele, “infantilizou a comunicação com os eleitores”, contribuindo para o desgaste da imagem do candidato.

Outros aliados do PSOL também avaliam que a esquerda precisa intensificar o diálogo com setores da sociedade, como empreendedores e trabalhadores de aplicativos, para ampliar seu alcance. A alta taxa de abstenção, que alcançou 31,54% no segundo turno, também foi citada como um fator relevante, com o número de ausentes superando o dos eleitores que optaram por Boulos.

A análise interna do PSOL, que destacou o crescimento da votação para vereadores no primeiro turno, foi de que “a campanha foi uma grande batalha contra o abuso do poder político e o uso da máquina pública”, ressaltou a direção do partido. “O futuro está ao nosso lado”, concluiu o comunicado.

Boulos, por sua vez, afirmou em suas redes sociais: “Alguns vão dizer que a esquerda tem que recuar e ceder em nossas visões de mundo, mas discordo. Não foi assim que o bolsonarismo conquistou parte importante da sociedade.” Para ele, a força da aliança entre Nunes e Jair Bolsonaro foi um dos principais obstáculos enfrentados.

O resultado das urnas reflete, para muitos especialistas, o desafio da esquerda de São Paulo em romper preconceitos e ampliar sua base de apoio em regiões que, historicamente, resistem ao perfil mais combativo de Boulos.

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