Lendo a notícia de que Daniel Alves será colocado em liberdade condicional depois de pagar cinco milhões de reais pensei no manifesto musicado das feministas chilenas que cantam: “O Estado opressor é um homem estuprador”.
Na performance que rodou o mundo elas dizem que os estupradores são também os juízes, os policiais, os políticos, o presidente. “O estuprador é você”, elas berram.
Hoje é um dia para cantar o hino e tentar, como conseguirmos, organizar a raiva que nos invade. O estado estuprador neoliberal não quer punir; quer espetáculo e dinheiro. Pessoas muito ricas podem tudo, inclusive cometer crimes. Esse tipo de regime é uma aberração ética e temos que saber organizar nossa raiva para assim, sem desvios no olhar, perceber as várias faces do inimigo: o estado, o sistema jurídico, as polícias, o poder executivo, o poder do capital privado. O inimigo tem mil rostos. E o estupro tem um preço: cinco milhões e meio de reais. Você tem esse dinheiro? Você está no grupo dos que podem estuprar uma mulher.
Esse aparenta ser o recado. Mas alto lá. As coisas estão mudando. Se não na lei, no ambiente social.
Daniel vai sair da prisão e sentir a brisa quente da luta em movimento. Não estará preso, mas estará condenado. Sua vida não vai mais ser a mesma. E isso a gente também pode colocar na conta da luta feminista. Até que ele seja definitivamente preso e/ou passe por um rigoroso processo educativo e compreenda os horrores da violência de gênero não descansaremos.
Verdade: que o Estado espanhol tenha colocado em liberdade uma pessoa condenada por estupro é ofensivo. Mas essa derrota não pode apagar as vitórias conquistadas até aqui: um homem rico e famoso foi levado ao tribunal. A vítima foi protegida. O processo foi respeitado com as investigações levadas a sério a cada passo do caminho.
Derrotas fazem parte de processos revolucionários. O importante é observarmos o caminho percorrido. Estamos em lugar inédito. O movimento feminista está forte e coeso. Daqui de onde estamos, não tem volta.
A letra completa do hino das feministas chilenas é:
“O patriarcado é um juiz
Por Uol – Milly Lacombe