Estudo mostra que aquecimento global foi principal responsável pela estiagem extrema registrada no bioma em 2023, enquanto El Niño teve papel secundário
Estudo publicado nesta quarta-feira (24) por um grupo internacional de cientistas especializados em clima mostrou que a mudança causada pelo homem no clima da Terra foi a principal causa da seca histórica que atingiu a região Amazônica em 2023. O El Niño, fenômeno climático natural que geralmente traz estiagens para a região, teve uma influência muito menor, diz o trabalho.
Segundo a pesquisa, do World Weather Attribution (WWA), a crise climática foi responsável por tornar a estiagem de 2023 cerca de 30 vezes mais provável do que ocorreria apenas pela ação do El Niño.
Desde meados de 2023, a bacia Amazônica vem enfrentando uma intensa seca, impulsionada pela baixa precipitação e pelo calor persistente. Em algumas regiões do bioma, rios atingiram seus níveis mais baixos em mais de 120 anos, impactando milhões de pessoas e animais.
Sendo a maior floresta tropical do mundo, e uma das regiões com maior biodiversidade do planeta, a Amazônia é o mais importante sumidouro de carbono terrestre. Ou seja, é o local do planeta com maior capacidade de absorver CO2 da atmosfera, o que confere ao bioma papel crucial na estabilidade do clima da Terra.
Os pesquisadores envolvidos no trabalho destacam que o desmatamento da floresta e as emissões induzidas pelo homem em nível local e global podem complicar – e até inviabilizar – a luta contra a crise climática.
“A Amazônia pode ser decisiva em nosso combate contra as mudanças climáticas. Se protegermos a floresta, ela continuará a agir como o maior sumidouro de carbono terrestre do mundo. Mas se permitirmos que as emissões induzidas pelo homem e o desmatamento a levem ao ponto de ruptura, ela liberará grandes quantidades de dióxido de carbono, complicando ainda mais nossa luta contra as mudanças climáticas. Para proteger a saúde da Amazônia, precisamos preservar a floresta tropical e nos afastar dos combustíveis fósseis o mais rápido possível”, disse Regina Rodrigues, professora de Oceanografia Física e Clima da Universidade Federal de Santa Catarina, e uma das autoras do estudo.
Futuro da Amazônia
A pesquisa feita pelo WWA considerou o período de junho a novembro de 2023. Chamada de “análise rápida de atribuição”, o trabalho investigou dois índices comumente usados para avaliar a gravidade da seca: a chamada “seca meteorológica”, que mede a precipitação no local, e a “seca agrícola”, que leva em consideração a evaporação da água de plantas e solos impulsionada por altas temperaturas e o desequilíbrio entre a água existe e a necessidade local.
Atualmente, a Terra já está 1,2º C mais quente do que os níveis pré-industriais. Nesse cenário, são esperadas secas meteorológicas severas a cada 100 anos, e secas agrícolas severas a cada 50 anos.
Uma análise dos dados históricos, no entanto, também indicam que a precipitação de junho a novembro na Amazônia está diminuindo à medida que o clima se aquece. Em um cenário de aquecimento de 2ºC, as secas meteorológicas extremas são esperadas a cada 33 anos e secas agrícolas severas a cada 13 anos.
Com a previsão de intensificação da seca na Amazônia até que as emissões globais sejam reduzidas a zero líquido – meta assumida internacionalmente para 2050, os pesquisadores afirmam que governos e comunidades devem se planejar para secas mais frequentes no futuro, envolvendo agricultores, comunidades indígenas e outros interessados locais.
“É crucial que as intervenções governamentais estejam voltadas para apoiar as comunidades a se prepararem para a intensificação da seca na Amazônia à medida que o clima se aquece”, diz Simphiwe Stewart, pesquisador do Centro Climático da Cruz Vermelha em Haia.
O estudo foi conduzido por 18 membros do grupo World Weather Attribution, incluindo cientistas de universidades e agências meteorológicas no Brasil, Holanda, Reino Unido e Estados Unidos.
POR CRISTIANE PRIZIBISCZKI • ECO