APÓS VENDER TRUFAS PARA CUSTEAR TREINAMENTOS, ‘CRIA’ DE DUQUE DE CAXIAS É SELECIONADA PARA O UFC

Depois de assinar o contrato com a organização, a atleta vai disputar quatro lutas na intenção de que o contrato seja renovado.

A atleta Julia Polastri foi selecionada para fazer parte da maior organização mundial de MMA, o UFC, neste mês, após uma luta em Las Vegas, nos Estados Unidos. Nascida e criada em Gramacho, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, a jovem não quer parar por aí.

Aos 25 anos, Julia sonha com o topo. Selecionada para o UFC no dia 12 de setembro, ela quer ser campeã mundial e está treinando duro para chegar até o cinturão.

“Eu quero ver até onde eu vou, eu quero ser a melhor disso! Chegar lá e ‘fazer um estrago’, ser reconhecida pelo meu trabalho”, destaca ela.

Depois de assinar o contrato com a organização, a atleta vai disputar 4 lutas na intenção de que o contrato seja renovado. Assim, ela pretende alcançar o ranking necessário para duelar com a campeã e conquistar o tão sonhado cinturão do UFC na sua categoria, que é peso-palha.

No entanto, o sonho não nasceu de agora. A jovem começou a treinar aos 17 anos como uma forma de aprender um esporte, mas aos 19 já estava competindo profissionalmente.

A trajetória não foi fácil, e nesse período ela precisou sair de casa. Depois de perder o emprego em um posto de gasolina, ela não sabia bem como ia se manter no esporte. Foi assim que ela parou nos vagões da Supervia com uma bolsa térmica e trufas para vender.

“No começo, não tive apoio da minha mãe. Eu fui morar com o Douglas [marido e treinador] e pensei: ‘Caramba, agora a gente tem que pagar aluguel’. No início, era apenas para pagar meu frango, meus suplementos, mas a trufa veio e salvou depois para esses gastos mais caros”, conta a atleta.

Vender doces foi a alternativa que Julia encontrou para arcar com os custos dos treinos e investimentos e não deixar o esporte de lado. Foram 5 anos se dividindo entre as vendas e treinos intensos até que ela conseguisse se manter apenas da luta.

 “Agora que eu sou contratada do UFC, penso em voltar no trem e distribuir algumas trufas em gratidão, tirar foto com a galera”, diz Julia.

Embora reconheça como essa fase foi importante para ela, Polastri conta que a rotina era difícil.

“A rotina no trem é bem estressante. Geralmente eu ia de manhã no sábado e só voltava quando acabava de vender. Teve vez de eu pegar o último trem saindo da Central para casa. Outras vezes eu ia pela manhã para tentar dar conta das vendas e dos treinos”, relembra.

Em toda a carreira, a atleta teve apenas um treinador, o marido, Douglas. Ambos celebram o sucesso de toda a dedicação investida, que durante a pandemia ficou balançada.

Nessa época, a academia ainda era no terraço deles, e os treinos acabaram sendo em casa.

“O pior momento foi a pandemia. Ela veio em um momento muito bom da minha carreira e do nada tudo caiu. E aí veio o baque, até se reestruturar de novo foi difícil. Até porque um lutador que treina sem lutar é muito complicado porque você está se preparando, mas sem saber para o quê”, recorda a jovem.

Por fim, foi criado um lema: “Do terraço para o mundo”. Agora, a academia fica na região de Caxias conhecida como Paraopeba e atende principalmente jovens do local.

A atleta acredita que a trajetória seria mais fácil se houvesse um investimento maior no setor do esporte, e que as lutas fossem aprendidas nas escolas. Para ela, alguns preconceitos seriam desmistificados se aprendidos desde a infância.

“Ainda tem um preconceito e uma sexualização feminina na luta. Muitos acreditam que é um esporte masculino. Uma vez no trem um senhor disse que gostava de assistir luta para ver as meninas de calcinha. Não tem como um esporte crescer assim no país”, reforça.

A própria atleta já ouviu coisas desagradáveis durante a trajetória.

 “Já ouvi muito ‘ah, mas você tem o rosto tão bonito para lutar, tão fofa, menina’. Minha vó no começo chegou a perguntar se eu não ia virar lésbica”, afirma.

Questionada sobre um conselho que deixaria para as novas gerações, Polastri fala em força.

Por Thaís Espírito Santo*, g1 Rio

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